02 agosto 2011

Os Andes de cada um


Já passava-se das nove da noite quando comecei a ler "Milagre nos Andes" do Nando Parrado. Começar a esta hora foi meu único erro, pois só consegui largar o livro depois de ler a última página e ainda meditar na capa depois das quatro da  manhã.

De tão bem escrito, o livro nos transporta. Nesse caso para a experiência dramática que o autor viveu em 1972, quando o avião que levava os seu time de rúgbi para jogar no Chile caiu nas profundezas dos Andes. Dentre os mortos e agonizantes estavam sua mãe e a sua irmã. Lutaram para suportar temperaturas gélidas sem comida alguma e com a notícia do rádio que as buscas haviam terminado.

A história já é bastante conhecida, o seu relato do autor impressiona pela franqueza e pelas infinitas mensagens implícitas da busca pela sobrevivência por amor. Não pelo amor a vida e sim pelo amor a alguém, no caso dele, pelo pai. Me perdoem por colocar aqui um trecho do final do livro, pois tenho mesmo a esperança que vocês o leiam. Mas eu não resisto, achei tão bacana que preciso compartilhar.

Depois de algum tempo, o Nando Parrado começou a dar palestras para contar essa história. Após uma delas, uma jovem pediu para falar com ele. Disse que há alguns anos, ao sair de ré da sua garagem, não viu e passou com o carro por cima da filha de dois anos. Que a vida dela parou naquele momento. Não conseguia mais comer, dormir ou pensar em nada que não fosse aquele instante. E desde então estava paralizada pela culpa e pela dor fazendo toda a família sofrer. Ela diz pra ele que a sua história mostrou que ela estava errada, que é possível viver, mesmo quando se sofre, e que ela deveria fazê-lo por amor ao marido e pelos outros filhos.

O autor então escreveu:

"Sem palavras, a envolvi nos meus braços e a abracei. Naquele instante,um pensamento informe que estava rondando minha cabeça assumiu um foco penetrante. Percebi que a minha história era a história dela; é a história de todos que a ouvem. Aquela mulher jamais sentiu uma rajada de vento abaixo de zero. Jamais cambaleou por uma nevasca nas altas altitudes ou observou seu corpo definhar de inanição. Mas não havia dúvida de que, fundamentalmente, ela sofrera tanto quanto eu. Sempre pensei na minha história como algo singular, uma coisa tão extrema e revoltante que apenas os que estiveram lá conseguiam entender de verdade o que passamos. Mas em sua essência - na essência da emoção humana - ela é a história mais familiar do mundo. Todos vivenciamos a dor, o abandono e perdas esmagadoras. E todos nós, cedo ou tarde, iremos enfrentar ainevitável proximidade da morte. Enquanto abraçava aquela mulher triste, uma frase se formou nos meus lábios. "-Todos temos nossos próprios Andes", eu disse."

Pensei nos meus Andes e nos de algumas pessoas que conheço. Gostaria de presenteá-las com este livro, ou melhor, com o sentimento que me tomou  ao ler este livro. Foi uma das melhores sacudidas que já tive. Por isso eu o indico, porque volta e meia nós precisamos de uma dessas para voltar para o eixo. Para isso é preciso estar atento. Ao nos permitirmos pensar as experiências dos outros, estamos ressignificando as nossas. E ao contarmos as nossas dores, as expurgamos e a colocamos em um lugar comum, necessário para encará-las de frente, aceitá-las e prosseguirmos.

E se tem uma coisa que aprendi queridinhos, é que só se faz gente feliz sendo feliz. Só se cria filhos bem resolvidos sendo bem resolvido(a). E que só conseguimos fazer com que eles acreditem que a vida vale a pena mesmo com os Andes, se nós realmente acreditarmos. Este livro é um belo exemplo disso.

5 comentários:

  1. Valzinha,

    Cada vez que passo por aqui percebo o quanto é bom ouvir as histórias e experiências da IF, vou à procura das que ainda não li e fico envolvida pelo magnetismo das palavras e da imginação!

    Parabéns amiga!!


    Um abraço apertado!!

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  2. Fofa, quero ler e depois filosofamos. Bj

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  3. Nooossaaaa que maravilha!Vou ler este livro o quanto antes, tenho certeza que ele me ajudara a passar por esta nevasca com grandes rajadas de vento abaixo de zero que estou passando... Rsrsrs ... Obrigada por vc com esse post, me fazer voltar ao caminho do meio eixo! Bjs

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  4. Val, essa história faz parte da minha infância. De todas as coisas que assistia escondida da mamãe... (afinal, lembra que há 25-30 anos atrás, aparecia aquela letreiro da censura, antes dos filmes, programas...etc?) essa foi a mais marcante. Pois é, deveria ter uns 7 ou 8 anos e recordo-me como se fosse hoje, eu agachada na porta do quarto dos meus pais, assistindo este filme. Lembro-me do quanto ele tocou-me a mente e principalmente o coração. Imagina para uma criança tentar entender o que se passou na cabeça daquelas pessoas, todo o sofrimento e superação. Bem provável que esta seja uma leitura obrigatória para mim, talvez não estivesse preparada para assistir algo com tanta magnitude, preciso assim esclarecer algumas dúvidas e sentimentos que nunca saíram da minha mente. Acho que devo isso a mim mesma, quase 30 anos depois.
    Valeu pela INCRIVEL dica!!!
    Bjão!

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