14 junho 2011

A, B, C e D em uma noite de namorados


Mês de junho em Salvador, sábado a noite, véspera do dia dos namorados. Claudia espera a chuva passar um pouco para ir buscar as duas amigas para saírem.
Uma delas é a Ana, a mais romântica. Enquanto se arrumava, por uns instantes ela se esqueceu do objetivo consumista da data e levou a coisa para o lado pessoal, bem na hora de escovar os cabelos. De repente a escova embolou-se e ela quase morreu de raiva por ter que desembaraçar o nó imenso e por ter que passar mais uma noite dos namorados solteira.
A outra é a Denise, a zen. Ela é jornalista, é a única que não tem filhos, que vive seguindo a corrente da vida, como ela mesma diz. A Ana a acha meio maluca, viajante demais, mas sai com ela já que a maioria de suas amigas está casada.
Escolhem ir para o Rio Vermelho, o bairro boêmio e alternativo da cidade, onde é possível encontrar pessoas de várias tribos e idades. Elas, que estão na faixa dos quarenta, não querem mais se arriscar a ir para um bar da moda e só encontrar a garotada que acabou de sair da adolescência.
Escolheram um barzinho tradicional e conhecido. Dão a sorte de encontrar uma mesa, bem no meio, na passagem para o banheiro. Ana que é, ou já foi, ou faz o tipo de uma moça comportada do interior sente-se desconfortável. Pede pra garçonete avisá-la assim que vagar uma perto da parede "pra não ficar muito exposta".
Enquanto isso, Denise coloca os pés na base da cadeira de Claudia, pede as bebidas e começa a cantarolar a música da Maria Rita que estava tocando.
A Claudia é da cidade, bem descolada, viajada e independente, acha a Ana até meio cafona, mas deixa pra lá. Mal se senta e já dá uma olhada 360° pra ver se tem gente conhecida. E sempre têm, ela conhece todo mundo. Bate a mão pra um, dá um sorrisinho pra outro até que uma levanta-se e vem ao seu encontro.
É a Beth, sua amiga há pouco tempo. Uma mulher elegante, da mesma faixa de idade, que trabalha muito, separada e com dois filhos que já são casados. Ela apresenta a Beth às amigas. A Beth sorri rapidamente para todas e a Claudia diz: -Oi Beth! Que bom te ver! Está bonita!
B- Bom também te ver Claudinha. 
C- Como você está? Legal aqui né?
B- Menina, é legal... Isso aqui... - E muda bruscamente o tom: -  Mas sabe desde que horas eu estou aqui? Desde às três da tarde, eu já deveria ter ido, mas não tenho o que fazer em casa...
Claudia a interrompe: - Quer sentar? - Olhando pro lado pra ver se achava uma cadeira. A Denise e a Ana também procuram, pois mesmo sem conhecê-la, sentiram vontade de saber mais sobre ela. As bebidas chegam e todas tomam um gole.
B- Não obrigada, eu tenho que voltar pra minha mesa. Eu não vou pra casa porque não estou gostando de ficar lá. Não quero ir. Pra quê? Pra assistir sozinha os mesmos filmes na TV, tomar remédio e ir dormir? As outras três olham cada vez mais interessadas. A Beth continua; - Quando eu sinto isso sabe o que eu faço? Eu tomo um whisky. Aí quando eu me dou conta eu já tomei dez! Vou para o Facebook e escrevo um monte de coisas. Escrevo até cansar e vou dormir.
Denise se controla para não rir do jeito espontâneo e quase cômico em que a Beth relata o seu drama.

E a Beth segue; - Até que no dia seguinte os amigos começam a ligar querendo saber como estou. E eu já nem me lembro mais o que foi que eu escrevi.
Denise não aguenta e ri. Beth percebe e não se importa, pelo contrário:
B- Você sabe que este bar aqui é o bar da paquera do momento. Tem de tudo aqui, homem velho, homem novo, homem bom! Mas é homem bom, bom mesmo!
Ana puxa a cadeira um pouco mais pra frente.
B- Então outro dia eu encontrei um MA-RA-VI-LHO-SO, pense num homem bom. Pensou? Ana balança a cabeça afirmativamente rapidinho. - 37 anos, solteiro, bom papo, bonito, bom de tudo, sabe? - Olha para Ana pra vê-la concordar de novo. - Saímos e então passei quinze dias com ele, uma maravilha, aquele homem bom, tudo certo, ótimo, maior love, sintonia em tudo... Daí sabe o que aconteceu? Ana agora balança negativamente e mais devagar. - O homem SU-MIU! Do nada!!!!! E nem me pergunte que eu não tenho a menor ideia por que foi. Ana toma um golão de vodca.
Claudia diz: - Mas é isso Betinha, é que esses sujeitos não sabem nem reconhecer quando encontram uma mulher de valor....
Beth interrompe: - E eu, como não sou uma vadia, que no dia seguinte sai procurando outro, sabe o que faço? Sabe Cau, o que acontece? Claudia levanta a sobrancelha esquerda e espera.
B- Eu me fecho. Vou ficando cada vez mais desacreditada. Ana toma o resto do drink todo de vez. E a Beth segue: - Eu já estou até pensando em procurar uma mulher.
Denise pede mais uma bebida pra cada, o negócio estava ficando bom. As três entreolham-se e lembram-se que esse é um assunto recorrente, Denise até escreveu uma crônica sobre isso.
B- Porque eu não aguento mais a solidão. Muito além de um homem, o que estou precisando é de carinho. Ana recosta-se na cadeira. Denise digita a frase no celular. Claudia tenta convencer a Beth a se sentar, mas esta diz que vai ao banheiro primeiro. Na volta, passa direto em direção à saída do bar, esquece até de dizer tchau.
As três permanecem sentadas e por segundos congelam-se em expressões diferentes. A Claudia pensa que a ideia da mulher não é tão ruim assim. A Ana olha para fora, vê a chuva e morre de inveja de quem está em casa abraçada com um namorado e a Denise acha tudo fantástico e rebobina mentalmente os detalhes da história pra não esquecer. Nesse instante chega a segunda rodada de bebidas, Denise olha para as outras duas e puxa um brinde:
A todas as possibilidades de interpretações dos papéis no grande espetáculo da vida! 
Claudia abre o seu sorriso largo e a Ana mesmo sem entender muito bem, ergue o copo. Estava pensando em retocar o batom mas deixa para depois.
Tin tin!  

9 comentários:

  1. Coisas dessa tal "LIBERDADE" Queridíssima!!!!!
    E viva a "Liberdade"
    Sds,bjs.
    Jorginho Peralva

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  2. Hahahahahah.
    Tô confusa sobre quem seria eu.
    Love you, xuxu.
    Syl

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  3. Nós somos um pouco de todas!!! Que bom que vocês gostaram!! Vem mais por aí! Bjsss

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  4. Legal demais Valzinha!!! Deu para viajar na história!!!

    Bjs
    Mel

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  5. "À todas as possibilidades de interpretações dos papéis no grande espetáculo da vida! E viva a liberdade!"

    adorei o que li, muito bom. hehe

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  6. E com aquela interpretação...foi MIL!

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