Nesta
viagem conheci mais uma categoria de profissionais pelos quais virei fã para
sempre. Os guias turísticos. Nesta excursão ficou provado que eles todos
merecem uma suíte presidencial em hotéis cinco estrelas no céu com spa e pensão
completa.
O
grupo que eu viajei foi pequeno, doze pessoas, o que não era suficiente para
ter um guia exclusivo. – Só vai ter guia exclusivo se fecharmos um grupo de
vinte pessoas - deixaram bem claro. Mas a confusão foi tanta, de tanta gente
querendo o dinheiro de volta, que eles mandaram para nós, e só nós tínhamos, um
anjo carioca chamado Maria José.
Zezé
é guia de grupos de adultos, crianças e adolescentes há vinte anos. Fora ela,
em cada cidade tinha um guia local e muitas vezes dois, tinha também o local do
local. Portanto, tive contato com uns quinze deles pelo menos. E com a
proximidade que estávamos, e com a quantidade de tempo que passamos juntos, não
tinha como não analisar profundamente a relação deles com os seus queridos
passageiros.
Vamos
lá, uma guia tem que acordar mais cedo que todo mundo, preparar uma voz boa e
ligar para o quarto de todos uma hora antes da saída do grupo. Ela liga e
repete o que foi dito pelo menos cinco vezes na noite anterior, fala de novo
qual é a hora do café, a hora de descer com a mala e a hora de entrar no
ônibus. Ela avisa se está chovendo, se está frio, se não pode vestir bermuda
porque vai entrar em uma igreja. Ela te lembra de pegar o ingresso, ela manda
beijo, tudo numa voz ótima em um horário de média de 5:30 da manhã.
Uma
guia vive te contando. Ela conta o seu grupo no café, no ônibus, no metrô, em
toda mudança de sala de um museu. Uma guia te avisa dos degraus para que você
não se estrebuche no chão, não caia no mar, não seja atropelada por um carro,
um cavalo ou uma bicicleta. Uma guia faz o check-in de todo mundo, se deixar
ela quer te ajudar a carregar a sua mala, a sua mochila, ela carrega a sua
vida.
Uma
guia tira fotos suas, é a única no grupo que se oferece para fazer isso. Já
disse que uma guia repete tudo muitas vezes? Pois ela repete, fala no microfone
do ônibus, depois fala do auricular que mesmo que só contenha três botões,
on/off, mais volume e menos volume, ela tem que sair colocando um por um para
funcionar. E depois de ter terminado de dar o aviso, exatamente dezesseis
segundos depois, vem alguém e pergunta a mesma coisa.
Ai,
agora o que dói mesmo são as perguntas. Preparados?? Respirem.
-
Zezé, como é mesmo esse negócio de gôndola? É que a minha mulher tem medo de
altura...
-
A gente vai chegar que horas na Torre de Pizza?
-
Nesse hotel que a gente vai tem hi fi??
-
E por que é mesmo que esses artistas (escultores gregos) faziam as esculturas
sem cabeça ou braços, todas assim amputadas??
-
Zezé, vocês vão levar a gente para tirar foto no túmulo da Julieta???
Eu
queria me desintegrar rapidamente, eu sou assim, morro de vergonha pelos
outros, chego a sentir dor na barriga. Nada no mundo irá me fazer entender a
razão da admiração dos turistas pela banheira do Nero, a cueca do Napoleão e o
bidé da Maria Antonieta.
Guia
tem que dar aula de história, de geografia, de cultura local, tem que saber
curiosidades, fofocas e piadas, tem que ser enfermeira, tem que entreter,
animar, acalmar, depende do ponto em que está.
Ela
me contou que esse negócio de dividir quarto com quem não conhece dá um
problema danado, muita gente faz isso, paga um preço caríssimo para pagar
barato. Ela já teve que apartar duas que quase caíram nos tapas. Disse de outra
que ia dormir na banheira toda noite porque a colega de quarto roncava muito.
Imagine
administrar tudo isso? Imagine um grupo de cinquenta meninos de quatorze a
dezesseis anos em um avião, todos acendendo a luz para chamar a comissária,
como um dominó, um por um? Ela disse que tinha que fazer cara séria mas sentia
um impulso incontrolável de rir, ai que dureza. Um guia tem que segurar o tempo
inteiro uma bandeira, uma sombrinha com a haste esticada, ou uma mãozinha que
faz barulho, um lenço ou uma antena com variações, vi até uma com um pikachu
grudado na ponta. Tudo para chamar atenção para que nenhuma ovelha do seu
rebanho saia da rota.
E
na hora que começam a berrar, quer dizer, reclamar? Pobre Zezé. A banheira de
um que vazou, o pé do outro inchou, um está passando mal no barco, um achou
aquela comida muito ruim e o outro achou muito cara. Outro dia que ela avisou
umas sete vezes, (já falei que guia que é guia tem que repetir?), espirituosa:
Olha, esse hotel que nós vamos é longe de tudo e perto de nada... E o ônibus
nem tinha terminado de frear que uma
metade do grupo perguntava se era longe enquanto a outra metade reclamava que
era longe.
Eu
usei protetores de ouvidos, de olhos, de costas, de nervos, de tudo. Se não
fosse o ipod e esse computador não estaria aqui para contar a historinha da
paciência da Zezé, minha ídola.
Muito bom!!!!!!
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