A Páscoa me lembra a roça do meu pai,
O lugar onde eu tive a minha melhor formação.
Lá a sexta-feira da paixão era um dia muito especial.
Não se podia comer carne nem beber, não se montava a cavalo, não podia judiar dos bichos, não podia xingar e nem varrer a casa.
Quando a noite chegava, ela trazia a lua cheia e as histórias do lobisomem
Que pegava quem magoasse o resguardo do dia santo.
Fico imaginando se todos fossem católicos como os da roça na sexta da paixão
E tivessem um dia de paz, de peixe e de recolhimento,
Onde não pudéssemos ouvir histórias como essas que estão na TV,
De morte e de covardia.
- Shhhhhh!!!!! Menino, sossega! Em dia de hoje não pode falar dessas coisas. Ninguém briga, ninguém bate, não pode ser ruim não! Se não vira mula sem cabeça!!!
É dia de jejuar e de lembrar do Cristo
Que morreu por nós a dizer que éramos filhos do mesmo Pai.
O Jesus Cristo, lembra?
Olho por todos os lados a procurar o meu povo da roça.
Onde foi parar o resguardo, a reverência, o lobisomem e a temeridade?
Deu lugar à mídia? É ela que nos assombra agora?
O pai não assombra, a justiça não assombra, o inferno não assombra mais.
Me tragam de volta a Páscoa de infância na roça!
Quero histórias de lobisomem e de assombração
E não essas do jornal.
Saudade de uma Páscoa de crianças espertas vivas
Que pedem a benção, colocando o joelho no chão, aos seus padrinhos.
Em que os pais e os primos, mesmo miseráveis, não matam seus filhos.
Não são ignorantes no amor.
Lá, no dia seguinte, tinha o sábado de Aleluia
Onde o susto maior era ver o boneco do Judas queimando.
Aquilo assustava.
O que dizer dos Judas de agora?
Saudade de domingo de Páscoa sem chocolate,
Só com a imagem de Anália virando os olhos e as mãos pro céu pra dizer que esse tinha sido o dia que Jesus tornou a viver.
Precisamos da comoção de Anália,
De sextas feiras da paixão,
De compaixão todos os dias,
Do renascimento de uma gente,
De resguardo.
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