14 fevereiro 2014

Quando ele acordou, o dinossauro continuava lá


Faz três anos que o Mario se separou. Logo que aconteceu, alguém falou pra ele que a dor da saudade não duraria mais que um ano. Era só vencer um calendário inteiro e passar por todas as datas comemorativas, que tudo ficaria bem. E desde então já se passaram três natais, três reveillons, e tudo três vezes, e o Mario segue em direção ao seu quarto aniversário sem a Lílian, e ainda com a mesma saudade enorme e pesada, a qual ele compara com um dinossauro, um certo tipo de amigo imaginário jurássico que não se extingue para lhe fazer companhia.
A Lílian já estava com outro, um professor que ela conheceu na internet. A Lílian sempre se queixava da superficialidade do Mario, de que ele não saía da revista Placar. Ela foi uma presa fácil para o professor munido de citações literárias e de poesias do Neruda decoradas estrategicamente. A Lílian achou isso o máximo, e está até hoje com ele. De vez em quando ela liga pro Mario pra saber se ele está bem, se fez a revisão no urologista, se encontrou alguém. Na verdade ela adora fazer ciúme para o professor, dizer que o Mario está a disposição dela e assim alimentar a intenção dele na viagem das poesias do Neruda.
Nos aniversários e natais era certo, ela sempre ligava. Era a melhor parte do dia para o Mario. Nestas ocasiões ele procurava encontrar pessoas e ir à lugares animados, mas era sempre a ligação da Lílian que provocava a maior emoção.
Estava chegando o seu aniversário. Ele se preparou para receber a ligação de Lílian e aproveitar para mostrar pra ela a poesia de oito versos que escreveu, num esforço danado, sobre o que seria amar a ausência de alguém, algo mais ou menos assim. Desta vez, ele teria coragem.
Chegou. Mario acordou checando o telefone. Olhava para ele o tempo todo no escritório e nada, com a poesia lá na carteira. Mario saiu para o happy hour com os amigos achando uma ótima ideia atender o telefone em um lugar bem barulhento. O tempo passou e os amigos foram deixando o lugar, um a um. Mario voltou pra casa sozinho, com o telefone e um resto de bolo na mão. Por sorte e por conta das cervejas que tomara, dormiu no final do jogo de uns times que ele não dava a mínima.
No outro dia acordou mais cedo do que o de costume, abriu os olhos já com o celular na mão. Nenhuma ligação perdida, nenhuma mensagem. No quarto, apenas o dinossauro, um pouco maior, um ano mais velho.



Segundo texto de 20 minutos do curso de Escrita Criativa na Escola São Paulo.

2 comentários:

  1. Vida que segue para Mario....

    Muito bom!!!

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  2. ... Vejo isto em muita gente, antes mais comum nas Marias, hoje nos Marios, é triste quando a gente deixa a nossa força no outro, mas em alguma momento da vida isto acontece.


    SOU O QUE SOU
    Algumas vezes, nos damos conta que com o tempo vamos nos amoldando demais, aos “amores” e ao mundo em redor. E de repente, descobrimos que nos distanciamos tanto da nossa essência, que não somos mais o que somos! Vem a tristeza e mostra que o caminho esta errado, falta algo ou muito! ..... veja mais em meu Face, síndrome do Mario, risos.

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