Ontem tive o prazer de assistir a companhia afinadíssima Los Catedrásticos com o espetáculo "Nova Mente" de novo já que fui também na primeira temporada no início dos anos 90.
Seja pela proposta da peça que é uma reflexão sobre a qualidade das letras das músicas baianas ou pela presença fantástica dos atores Cyria Coentro, Jackson Costa, Maria Menezes e Ricardo Bittencourt sob a direção de Paulo Dourado - a ida vale muito a pena.
Nesta temporada eu confesso que não entendi algumas propostas do diretor e me perdi algumas vezes, mas facilmente voltava o foco para as caras e bocas da Maria, a presença de palco da Cyria e a expressividade do Jackson e do Ricardo.
O espetáculo começa a desconstruir as letras de uma forma leve e divertida abordando a total falta de sentido das mesmas e o abuso da repetição. E vai ficando mais forte a medida que explora a qualidade das músicas de alguns grupos de pagode e funk que vêm piorando a cada dia. Destaco a cena em que as atrizes ficam em posição de quatro usando coleiras representando a forma extremamente vulgar em que as mulheres estão sendo cantadas. A mensagem chega de forma rápida e impressiona.
Eu não sabia se me sentia aliviada por não conhecer tais músicas, se é que podemos chamá-las assim, e por tanto não fazer parte do grupo de pessoas que as consomem, ou muito envergonhada por saber que elas existem e são tocadas livremente por aí, dançadas por mulheres e crianças ao nosso redor.
Lembro-me que ao chegar dos EUA para um feriado após oito meses interruptos (inclusos verão e carnaval) fomos a uma festa que a tia das minhas filhas as ofereceu para que elas pudessem rever os seus amigos.
No início o DJ do lugar me perguntou se poderia tocar todos os pagodes e eu disse que não, que era festa de crianças. E ele disse em tom irônico; - "Ah, a senhora vai ver!"
O padrão musical que escolhi não durou nem meia hora. Fui abordada por umas quarenta crianças de oito a dez anos em coro para que eu "liberasse"o DJ. "Pois bem, vamos conhecer então o que vocês querem ouvir!" respondi, mole que sou, só para ouvir o ÊÊÊÊÊ geral que sempre acontece quando cedemos.
Tanto pelo fato de estar chegando de uma cultura diferente quanto por não ter participado do surgimento daquelas músicas o fato é que me espantei pra valer. A sensação era exatamente a mesma que senti ontem; repulsa. As minhas filhas viam todas as amigas cantando e dançando e olhavam para mim como se aquilo fosse em outra língua, elas não sabiam cantar tampouco sabiam que horas deveriam abaixar e onde colocar a mão.
Eu - egoisticamente de novo - me senti orgulhosa por elas não fazerem parte daquilo e aliviada por estar indo embora em alguns dias. Só que estamos de volta - bem feito para mim - e logo vão chegar as festinhas e é bem possível que elas queiram aprender a dança do grupo.
Natural, se não fossem danças horrorosas, sem mais duplos e sim com só um único sentido; a vulgarização da mulher. Lamentável queridos companheiros pais. É uma mancha em nossa cultura, uma prova de descaso com o que ouvem as crianças do nosso país e um impuso para a iniciação sexual precoce, a gravidez precoce, a violência sexual e a prostituição infantil.
O aniversário da caçula vem aí. E desta vez vou colocar mais critérios na seleção das músicas do que na qualidade dos doces. E não vai adiantar insistir. Preciso fazer pelo menos a minha mínima parte para conter este movimento do mau gosto. Agradeço ao espetáculo Los Catedrásticos por me trazer todos esses pensamentos. Vida eterna ao Teatro pela sua capacidade de nos sacudir, mesmo que seja com o não cantar e longe das melodias envolventes, nos despertar para aguçarmos a qualidade do que ouvimos e do exemplo que queremos passar para as nossas crianças.
Concordo plenamente. E lhe digo mais, não é difícil tiramos nossos filhos dessas exposições ridículas, pois eles são nossos espelhos. Crianças que passam a gostar desse tipo de cultura são crianças em que os pais ou responsáveis não oferecem outras opções para elas, é muito simples. O triste é saber que a maioria é assim.
ResponderExcluirAline
Aqui nao eh diferente, Valzinha. As musicas mais tocadas nas radios que os jovens ouvem, sao extremamente vulgares! O meu problema eh na verdade a combinacao de dois problemas: Primeiro, acho que pelo fato de eu ser fanatica por dancar, o ritmo das musicas eh o que me encanta logo de cara! Nao to nem ai pras letras. E segundo, acho que pelo fato de ter sido criada no Brasil, sem entender quase nada de ingles, meu ouvido foi condicionado a dancar e gostar das musicas mesmo sem entender bulhunfas do que se tratavam as letras. Mas apesar de hoje, entender o ingles quase 100%, eu percebo que pra mim, o ritmo das musicas, ainda fala mais alto. La vou eu dancar toda animada, e vem minha filha de 16 anos me perguntar: Credo, mamae, voce gosta dessa musica? E eu digo: Sim, eu adoro! E ela: Voce sabe o que ele esta dizendo? E eu: Nao tenho a menor ideia! Ela diz: Ahh, ta explicado! E eh sempre assim, vale para a maioria das musicas tocadas para dancarmos. Uma pena mesmo!!
ResponderExcluirAinda bem que ela nao curti esse tipo de musica! O negocio dela eh curtir rock com o namorado.
Pois bem Valzinha, no meu caso so tenho uma saida. Voce sabe que aqui nessa cidade, o unico lugar que temos para dancar eh o Fresco II, onde o nosso amigo George eh o DJ. Entao, se eu for comecar a prestar atencao nas letras, vou ficar sem dancar a maior parte da noite :( Triste, ne? Eu adoraria assistir a esse espetaculo e muitos outros ai no Brasil! Ai como eu queria!!
Adorei sua nova proposta de escrita. Alias, eu adoro tudo o que voce escreve, porque vem do seu coracao, que eh muito lindo!!
Incrível falível vc sabe como pôde acontecer de vc não entender tudo em Nova Mente? É q se perder faz parte. Como na vida, não entendemos tudo. Nunca. Tudo nunca. Os textos de auto-ajuda e os do youtube são muito estranhos e quase incompreensíveis. Quando tudo vai ficando claro demais aí vem o Mestre Caveira e pimba!
ResponderExcluirEntendeu?
Abç, Paulo Dourado.
Gente, olha quem veio aqui!!!! Uma figura central no teatro baiano, um mestre na arte das cenas de quem tive o enorme prazer de ser aluna, hoje eu não durmo!!!!! MERDA e muito sucesso para você querido, que continue assim com casa lotada, proporcionando à Bahia seu teatro de primeira com todos os seus signos, os compreensíveis e os nem tanto, que fazem parte de uma história intrigante e sensacional!
ResponderExcluirMuito obrigada por sua visita aqui, espero te ver em breve. Abraços!